terça-feira, 26 de outubro de 2010

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

"Água de beber, água de beber camará." Tom jobim

Não se importando que a sexta-feira tivesse ficado para trás, seguiu a chuva a cair sobre a cidade ao longo de quase todo o dia de sábado. Foi com a lâmina d’água sobre o asfalto que os rastros dos pneus tornaram-se visíveis. Cascatinha, Lomba do Pinheiro, Campus Ipiranga, Trensurb. Centro, Periferia, Centro, Grande Porto Alegre, Centro. O coletivo do transporte públicoletivo em seu movimento pendular.

Da pergunta original [que se fez do pecado original], sobre o que aconteceria quando o som das águas de uma praia migrasse [descontextualizado] para se fazer existir em um espaço outro – por exemplo, o do interior de um ônibus, também aquele dentro de um vagão de trem - povoado de pessoas e de seus próprios sons, não se tem notícias. Talvez a oferta da possibilidade de que as águas e as pessoas se misturassem ou enquanto em paralelo dialogassem - caudalosas, suculentas, cheias de barulho e silêncio.

Foi no encontro - percebendo e reconhecendo o ambiente que se modificava - que se fez a necessidade momentânea da busca pela prova, o elemento vestido de materialidade. À medida que as fontes sonoras - quatro tocadores de CDS portáteis [ocultos em sacolas] e um telefone celular, – iam sendo acionadas, uma após a outra, somando-se, fortalecendo-se, ampliou-se o registro da ação das águas da prainha de Belém Novo. Tornando-se viva a idéia imaginada de que a chuva estivesse a invadir o ônibus, por algum furo, fresta ou janela aberta. E teria ela tamanha fluidez, qual jorro de torneira esquecida, rompimento de tubulação.

Os passageiros que foram pegos, inundados, reagiram cada qual há seu tempo e maneira. Os olhares se puseram cobertos de desconfiança; fizeram-se giros de cabeça e tronco; pés abandonaram o piso - elevados para o alto como quem suspende os móveis da casa na tentativa de salvá-los do pior; vômito(?); costurados à riqueza das observações [“É um trem fantasma!”, “Trata-se de uma pesquisa de comportamento.”, “O som da água me faz relaxar.”].

Em determinado momento todos os aparelhos a reproduzirem ao mesmo tempo, o mesmo registro, ampliando, a ponto de encherem o espaço por completo. E na iminência de transbordar, um movimento inverso, delicado, fez com que o conteúdo do recipiente voltasse ao seu nível habitual. A enxurrada, assim como as pessoas [embarcam e desembarcam], chegou e se foi [levada por cada uma delas, no corpo, nas roupas, nos sapatos].